Em uma sala com temperatura de 25°C, Wellinadia Lima, biomédica do Hospital e Maternidade São Lucas (HMSL), manuseia com delicadeza frascos que carregam vida. Seus movimentos lentos e olhares atentos aos recipientes reforçam o lema da Campanha de Doação de Leite Humano de 2024: “Amor em cada gota doada, vida em cada gota recebida.” Esta é parte da rotina da equipe do Banco de Leite do HMSL, que há mais de uma década acolhe mães com dificuldades em amamentar seus filhos.
No 1º andar do Hospital e Maternidade São Lucas, em meio a paredes lilás, mulheres de Juazeiro do Norte e de outros municípios, especialmente mães com bebês internados em unidades neonatais, são acolhidas e orientadas sobre a importância da amamentação. Nesse mesmo espaço, são convidadas a doar vida. Segundo Rosemary Cassiano, coordenadora do setor, o Hospital realiza campanhas regularmente para sensibilizar mulheres que estão amamentando a se tornarem doadoras. “O leite recebido de doação ajuda a salvar vidas na UTI Neonatal, pois esses recém-nascidos, por serem prematuros extremos, devem ser alimentados com leite humano. O Agosto Dourado simboliza a luta pelo incentivo à amamentação, e o dourado representa os padrões de ouro da qualidade do leite humano,” explica Rosemary.
No HMSL, uma média de 35 bebês prematuros são alimentados mensalmente com leite humano. Um único frasco de 300 ml pode ajudar até 10 recém-nascidos, considerando as 8 ofertas de dieta fracionadas, conforme prescrição médica e de acordo com as necessidades de cada bebê. Os benefícios da doação não são exclusivos para as crianças. “A amamentação também traz inúmeras vantagens para a mãe, como a recuperação pós-parto, perda de peso, e a prevenção de doenças, como a redução das chances de desenvolver câncer de mama e depressão pós-parto, além de fortalecer o vínculo afetivo entre mãe e bebê,” afirma Rosemary.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a amamentação é essencial para a nutrição e o desenvolvimento da criança. O leite materno é rico em proteínas, vitaminas, gorduras, água e anticorpos, proporcionando todos os nutrientes necessários para fortalecer o sistema imunológico do recém-nascido. Segundo a SBP, essas gotas ricas e cheias de vida ajudam o corpo a criar uma defesa natural contra diversas doenças e infecções, como alergias, diarreias e doenças respiratórias. Além disso, o leite materno contribui para o desenvolvimento neuropsicomotor e para a redução da mortalidade neonatal.
Conforme a direção do setor, os meses festivos, como junho, julho, dezembro e janeiro, são os períodos de menor doação. “Por conta das festividades regionais, nossos estoques diminuem, e nesses períodos utilizamos o que conseguimos arrecadar nos outros meses. O ideal é que recebamos doações todos os meses para que nosso banco não fique em baixa, garantindo a alimentação dos pequenos na UTI”, destaca Rosemary Cassiano.
Qualquer pessoa que amamenta pode ser uma potencial doadora. Basta ligar para o número 2131-5035 do Hospital e Maternidade São Lucas. A equipe anotará os dados da doadora e, em seguida, visitará sua residência para entregar os frascos e orientar sobre a extração e o armazenamento do leite no congelador. A cada oito dias, o procedimento é repetido, com a entrega de novos frascos e o recolhimento dos potes cheios. O setor funciona diariamente das 7h às 19h.
Cuidado além da doação.
Muito além da busca por doações, o Banco de Leite do Hospital e Maternidade São Lucas (HMSL) apoia mulheres que descobrem o lado não romântico da amamentação. Para que a amamentação seja bem-sucedida, é necessário garantir a pega correta, a sucção vigorosa do bebê, uma posição adequada, além de uma boa alimentação e um corpo bem hidratado. No entanto, as grandes mudanças pós-parto, especialmente em fatores psicológicos, hormonais e a baixa rede de apoio, muitas vezes impedem que as novas mães desenvolvam as habilidades necessárias.
Esse é o caso de Zulene Costa, dona de casa e mãe de uma bebê prematura de 34 semanas, que chegou à equipe do HMSL preocupada com a perda de peso de sua filha. Sem conseguir amamentar e culpando-se por achar que seu leite era fraco, ela buscou suporte. “Eu vim em busca de ajuda porque achei que meu leite não era suficiente. Ela não pegava o peito direito e estava perdendo peso rápido. Quando cheguei aqui, fui orientada sobre como estimular a pega. Agora, ela já ganhou peso. Senti muita gratidão, fiquei muito feliz por ter sido ajudada e ainda continuar sendo”, agradece Zulene.
De acordo com Rosemary Cassiano, é comum que as mães acreditem que não estão oferecendo uma alimentação adequada a seus bebês. “Por isso, é muito importante que elas saibam que não estão sozinhas e que o Banco de Leite Humano é uma importante rede de apoio. Somos preparados para acolhê-las e auxiliá-las a superar esses obstáculos, proporcionando uma jornada mais tranquila e prazerosa, além de uma nutrição completa e saudável para o seu filho”, explica Rosemary.
Compartilhando vida
Entre a rotina como assistente administrativa e a maternidade, Daniele Marcelino, de 36 anos, reserva alguns minutos do seu dia para compartilhar a vida. De manhã, antes do trabalho, ela retira o leite para o seu bebê de sete meses. À tarde, coleta outro pote, e à noite, repete o ato que salva a vida de dezenas de crianças na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN).
“Decidi ser doadora quando fui mãe pela primeira vez. Já tenho uma filha de 9 anos, mas naquela época, eu não conseguia doar, pois morava no sítio e a locomoção era complicada. Além disso, eu não tinha onde fazer o armazenamento adequado para a doação, e isso me causava muita tristeza, pois desperdicei muito leite. Não havia mães próximas a mim que precisassem. Então, decidi que, se fosse mãe novamente, eu faria o possível para doar”, relata Daniele.
Doadora do Hospital e Maternidade São Lucas (HMSL) desde o nascimento de seu segundo filho, Daniele encoraja outras mulheres a seguirem seu exemplo. “É de extrema importância que as mães tenham consciência da doação de leite humano. Também ressalto que é um alimento que, quanto mais se retira, mais se produz, então as mães não precisam se preocupar, pois não faltará leite para seus bebês. Eu faço doação desde o terceiro dia de vida do meu filho; hoje ele tem sete meses e ainda produzo leite suficiente para ele e para a doação”, revela.
Quando perguntada sobre um dos seus maiores orgulhos, Daniele não hesita em afirmar que doar leite é um deles. “Tenho muito orgulho em poder ajudar a alimentar as vidas que estão precisando. Tenho plena consciência da importância do aleitamento materno, pois é o primeiro alimento para a vida do bebê e contém todos os nutrientes essenciais para o desenvolvimento da criança”, conclui.